Dizem os especialistas que, quanto maior a escolaridade, maior a chance de conseguir emprego e ganhar mais. Entretanto, ter o jovem passado pelos bancos escolares ou ter um diploma não é garantia de ingresso no mercado de trabalho. Pesa sobre eles a falta de experiência. Esse é um dos fatores que torna o grupo mais penalizado na maior crise econômica do país em um século. Eles não apenas têm as maiores taxas de desemprego, como foram os que mais perderam renda. Esse é o retrato de cinco milhões de brasileiros, de 14 a 24 anos, que estão em busca de emprego, segundo os dados mais recentes do IBGE. Eles representam 42% do total de desempregados do país.

"Essa é a realidade de milhões de jovens que conseguem diploma, mas não encontram emprego. É triste ver tanta mão de obra jogada fora por conta de uma crise que penaliza tantos os mais jovens quanto os mais experientes, afinal ela não poupa ninguém. Só nos resta trabalhar para que o país volte a crescer e traga de volta as oportunidades de trabalho para todos", conclui Canindé Pegado, presidente do SINCAB.

Eduardo, Cristiellen, Lucas, Tamela, Bárbara e Gabriel fazem parte de uma geração de jovens que chega ao mercado de trabalho na maior crise econômica do país em um século. Cinco milhões de brasileiros, de 14 a 24 anos, estão em busca de emprego, segundo os dados mais recentes do IBGE. Eles representam 42% do total de desempregados do país.

O GLOBO acompanhou esses seis jovens por seis meses. Eles mostram que o sucesso ou a frustração na saga por uma primeira oportunidade não é explicada apenas pela conjuntura econômica. Os obstáculos vão desde o nível de instrução e a área que abraçaram até a personalidade, moldada pelo ambiente em que cresceram. Passam ainda por barreiras impostas pelos empregadores, como um visual fora do padrão e a distância entre casa e trabalho.

É consenso entre especialistas que, quanto maior a escolaridade, maior a chance de conseguir emprego e ganhar mais. No entanto, para o jovem, ter passado pelos bancos escolares ou ter um diploma não é garantia de ingresso no mercado de trabalho, um dos ritos de passagem para a vida adulta. Pesa sobre eles a falta de experiência. Esse é um dos fatores que os torna o grupo mais penalizado na crise. Eles não apenas têm as maiores taxas de desemprego — um em cada quatro jovens de 18 a 24 anos está sem trabalho — como foram os que mais perderam renda.

 

Queda maior na renda dos mais jovens

Levantamento feito pelo economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social e ex-presidente do Ipea, mostra que, no segundo trimestre deste ano, a renda média real dos jovens de 15 a 19 anos havia caído 13,6%, mais que o dobro da média geral (5,6%), em comparação com igual período do ano passado. Para os de 20 a 24 anos, a renda encolheu 9,2%. Na faixa etária de 25 a 29 anos, a queda foi de 7,8%.

— A vida do jovem no mercado de trabalho, mesmo com educação, não é fácil. Mas sem educação seria muito mais difícil. Historicamente, a taxa de desemprego é sempre mais alta para esse grupo, seja pela falta de experiência ou pela elevada rotatividade, pois ele sempre quer experimentar coisas novas. O jovem é irrequieto. Até certo ponto essa busca é saudável — diz Neri.

Essa inquietação é exacerbada nos jovens que nasceram na década de 1990, a chamada Geração Z. Imersos em um mundo digital, foram criados em uma sociedade marcada pelo imediatismo. Buscam resultados rápidos e são capazes de recusar oportunidades porque o salário é baixo, mesmo estando desempregados.

— A Geração Z nasce em uma sociedade marcada pelo mito do enriquecimento rápido e do sucesso imediato. Isso faz o jovem acreditar no crescimento meteórico e que aquele que não seguir esse caminho está inadequado. Por isso, muitos esperam o que seria a hora certa para atingir seus objetivos e acabam rejeitando oportunidades — diz o filósofo e escritor Mario Sergio Cortella.

Esses jovens cresceram num momento em que a economia brasileira prosperava. A crise foi um banho da água fria nas suas expectativas e eles tiveram que aprender a lidar com a frustração de não encontrar emprego ou ter de fazer um desvio de rota. Dos seis jovens que o GLOBO acompanhou, metade está desempregada. Os outros três conseguiram trabalho em áreas distintas das que desejavam.

 

O difícil caminho de quem busca a primeira vaga

Bárbara fez curso técnico de Turismo e hoje trabalha como auxiliar administrativa. Gabriel fez curso técnico de Administração de Empresas, mas virou porteiro. Lucas formou-se em Relações Internacionais e acabou numa empresa de games. O engenheiro civil Eduardo e as jovens Cristiellen e Tamela, ambas com ensino médio, continuam desempregados.

É comum o jovem, ao não encontrar trabalho em sua área, ser pouco seletivo e disparar para todos os lados, mesmo sem ter o perfil desejado para as vagas pretendidas. Cada não que ele escuta, porém, pode minar ainda mais sua disposição de seguir em frente, avalia Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos no Rio de Janeiro. Para Sardinha, falta paciência aos jovens para entender que, às vezes, é preciso “dar um passo para o lado”, ou seja, aceitar um emprego mesmo que não seja o dos sonhos:

— A entrada no mercado tem de ser encarada como uma oportunidade de ter a própria independência. É legítimo o sonho de poder trabalhar com o que se gosta, mas existe uma fantasia sobre esse ser o único caminho.

 

Todas as histórias: os jovens que buscam o 1º emprego em plena recessão

A falta de perspectivas de uma vaga na sua área de formação levou Eduardo Buys, de 27 anos, a sobrevoar o Oceano Atlântico, rumo aos Estados Unidos, exatamente um ano após ter recebido o diploma de Engenheiro Civil pela UFRJ. Ele desembarcou em Nova York no fim de setembro. Na bagagem, levou a expectativa de compensar a falta de oportunidades de trabalho no Brasil ganhando experiência de vida.

— Na minha área não surgiu nada nesse tempo todo. É zero vaga. E, se surge para um amigo, é porque alguém o indicou. Não estou conseguindo esses contatos. Depois de estudar por tanto tempo, é frustrante. Mas temos de entender que o momento do país não é o melhor e não vai melhorar tão cedo. Por isso, enquanto essa maré ruim não passa, vou aprender outra língua, outra cultura. Assim, não saio perdendo — diz o engenheiro civil, ressaltando que contou com o apoio dos pais.

Mais jovens como Eduardo ficaram desempregados durante a recessão. E passaram a viver nessa condição por muito mais tempo. Levantamento exclusivo feito pelo Dieese mostra que o tempo médio de procura por trabalho entre pessoas de 16 a 29 anos das regiões metropolitanas de São Paulo, Porto Alegre, Salvador, Fortaleza e Brasília aumentou em dois meses e meio nos últimos três anos. Em setembro de 2013, o jovem aguardava sete meses por uma oportunidade. Em setembro deste ano, a espera já chegava a nove meses e meio. À medida que o tempo passa, aumenta a frustração de quem sonha em arranjar um emprego.

— O desemprego de longa duração dificulta a trajetória profissional desses jovens e os coloca em situação de perigo social. Quando a juventude tem dificuldade no mundo do trabalho, ela recorre à escola. E quando não há essa alternativa, como hoje, em que os próprios jovens questionam a qualidade do ensino, vide a ocupação das escolas, ele recorre à inatividade. Temos uma juventude sem esperança. Economicamente é um desperdício. O futuro do país foi colocado em xeque — analisa Lúcia Garcia, coordenadora técnica do Sistema Pesquisa de Emprego e Desemprego do Dieese.

 

MATURIDADE PARA LIDAR COM A FRUSTRAÇÃO

Fausto Augusto Junior, coordenador de Educação da entidade, diz que esse aumento do tempo de procura é anormal e reflete a deterioração da renda das famílias. Ele acredita ser papel do Estado retardar a entrada do jovem no mercado de trabalho, para que ele permaneça mais tempo na escola:

— Com as condições financeiras das famílias agravadas com a recessão, muitos jovens foram empurrados precocemente para o mercado. O jovem não sai da escola porque ela é ruim, mas porque é impelido a ir procurar emprego. E, nesse momento em que há menos vagas disponíveis e mais gente procurando, aumenta o tempo do desemprego.

Eduardo de Oliveira, superintendente educacional do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), recomenda que, diante da escassez de recursos, os jovens procurem cursos à distância oferecidos de forma gratuita, que incluem ensino de línguas estrangeiras, técnicas de administração, marketing de vendas e conteúdos específicos para determinadas áreas.

Para a psicóloga Monica Portella, associada ao Instituto Internacional de Psicologia Positiva, falta ao jovem de hoje capacidade para lidar com a frustração na busca por uma vaga:

— Essa geração é imediatista, acredita que basta apertar um botão para conseguir o que quer. Mas o mundo real não é assim. É preciso desenvolver resiliência, a capacidade de se frustrar e sair fortalecido da situação. Uma competência que é aprendida ao longo da vida e que os jovens de hoje têm muito pouco desenvolvida.

 

‘É O QUE TEM PARA HOJE’

Nos dois últimos anos de faculdade, Eduardo estagiou em uma construtora. Mas, ao concluir o curso, em vez de ser efetivado, foi dispensado, pois o mercado para o setor já havia encolhido:

— Até tentaram me colocar como auxiliar de engenharia depois que me formei. Sabia que ia ganhar um pouco menos do que esperava, mas era o que tinha. Mas nem isso rolou, porque apenas duas das quatro obras previstas saíram do papel — conta o jovem engenheiro.

Para tornar os meses de espera por uma outra oportunidade menos angustiantes e não perder a autoestima, Eduardo passou a ajudar os pais na loja de conveniência da família, localizada na Barra da Tijuca. Ficou responsável pela reposição de estoques. Eduardo também se aventurou na ocupação da moda. Em maio, fez um bico como motorista do Uber usando o carro do irmão, que já era cadastrado no serviço. Mas, em vez de uma renda extra, acabou levando um grande susto. Na segunda semana, se envolveu em um acidente de trânsito na Avenida Brasil:

— Não me machuquei, mas o carro foi para a oficina e lá ficou um bom tempo. Voltei a ajudar meus pais na loja.

Especialistas recomendam seguir com projetos paralelos. Afinal, a vida continua. Gabriel Durans, de 19 anos, concluiu o ensino médio no fim de 2014. Com um diploma de curso técnico em administração pelo Senac em mãos, participou de processos seletivos de grandes empresas por quase um ano e meio.

A única porta que se abriu foi a de um prédio residencial em Icaraí, Niterói, onde trabalha como porteiro desde maio. Gabriel vê o emprego, que lhe rende R$ 1.200 mensais, como algo temporário e alimenta o sonho de cursar uma faculdade. Enquanto não consegue, dá aula de bateria para garantir uma renda extra e acaba de gravar o primeiro clipe de sua banda, a Pro X, que toca músicas evangélicas:

— Sempre busquei minha independência financeira. Quando estava na escola, vendia salgado. Ser porteiro não é o que queria. Mas é o que tem para hoje. Em paralelo, faço apresentações em igrejas com minha banda. Isso me faz bem. Nosso próximo passo será gravar um CD.

Além de ajudar a reduzir a angústia, especialistas afirmam que o envolvimento em projetos, de cunho social ou hobbies coletivos, amplia a rede de relações interpessoais, o que pode acabar sendo um atalho para uma vaga. Mal não faz.

 

Geração Z também quer satisfação

Eles rejeitam propostas mesmo desempregados e deixam as empresas se não estão satisfeitos. Assim é a Geração Z, jovens que nasceram entre 1990 e 1999 e que, até 2020, serão 20% da força de trabalho mundial, segundo pesquisa da empresa de recrutamento Robert Half. Para jovens com esse perfil, que têm entre 17 e 26 anos, a dificuldade de encontrar ou se manter num emprego vai além da crise. Imersos no mundo digital e criados numa sociedade marcada por imediatismo e valorização do prazer pessoal, buscam resultados rápidos e elegeram a qualidade de vida como uma de suas prioridades.

Para muitos, as referências são celebridades, jogadores de futebol ou jovens que fundaram start-ups e viram o número de zeros triplicar na conta bancária em pouco tempo. Não à toa, salários generosos estão entre as sete prioridades dessa geração quando procuram emprego, segundo a Robert Half. Jornada flexível e busca por um propósito no trabalho são fatores levados em consideração na hora de escolher a vaga que pretendem disputar.

Formado em Engenharia Civil pela UFRJ e nascido numa família de classe média alta no Rio, Eduardo Buys, de 27 anos, chegou a concorrer a uma vaga de analista de dados esportivos para ganhar R$ 2 mil por mês. Ele estava há mais de seis meses desempregado, mas resistia em aceitar a proposta.

— Se me chamarem, não vou. O salário é muito baixo — disse o rapaz, em junho, quando participava do processo seletivo.

Parte da resistência de Eduardo deve-se à reviravolta no mercado de trabalho com a crise econômica. Em 2015, quando a demanda por engenheiros civis ainda estava inflada, o salário oferecido a um recém-formado em processos seletivos da empresa de recrutamento PageGroup era na faixa de R$ 8 mil mensais. Em 2016, nas poucas vagas para esse perfil de profissional, o salário é de R$ 6 mil.

— Quando eles completam um ano de formado e estão desempregados, bate o desespero. Aí começam a olhar outras opções. Essa demora em perceber o que está acontecendo se deve ao fato de que esses jovens não estão acostumados com a crise. Estagiaram num momento em que a economia ia bem, tinham expectativa de que iam arrumar um bom emprego — avalia Viviane Prado, gerente da Page Personnel, um dos braços do PageGroup.

A inquietação, típica da juventude, é exacerbada na Geração Z e independe de classe social. Com uma dependência em Física que não lhe permite concluir o ensino médio, Bárbara Pinheiro, de 18 anos, fez o curso técnico em Turismo. Começou a procurar trabalho no início do ano. Queria ajudar em casa, já que a mãe recebe auxílio-doença de R$ 900 por mês e a avó, uma pensão de R$ 3 mil. Após ser demitida no seu primeiro emprego, em junho passado, começou a trabalhar numa agência de turismo, na Barra da Tijuca (Zona Oeste do Rio), em agosto. Duas semanas depois, pediu as contas.

— Não estava sendo produtivo, era longe da minha casa e não estava curtindo a Olimpíada — disse Bárbara, que mora em Irajá, na Zona Norte, e passou a aproveitar o tempo livre para ser guia informal de duas americanas de passagem pela cidade.

 

EMPRESAS TAMBÉM PRECISAM SE ADAPTAR

O baixo tempo de permanência dos jovens no trabalho preocupa as grandes corporações.

— Os jovens de hoje têm menos apego ao emprego. Num momento de escassez de recursos como o que vivemos hoje, isso é preocupante. Você treina e depois o cara vai embora — diz Fernando Mantovani, diretor de Operações da Robert Half.

Da mesma forma que a inquietação pode se tornar um problema — para a empresa e para o futuro profissional — ela também é virtude. É difícil definir o limiar entre as vantagens e desvantagens desse comportamento. Anamaíra Spaggiari, coordenadora de Carreiras da Fundação Estudar, aconselha os jovens a tentar deixar um legado. Se concluíram um projeto, por exemplo, podem se dar por satisfeitos e preparados para iniciar um novo ciclo em outro lugar. Ela enfatiza que as empresas precisam se adaptar, oferecendo tarefas mais desafiadoras, que levem os jovens a ter vontade de ficar e aprender.

O curto tempo de permanência no emprego, no entanto, não pode ser atribuído apenas ao imediatismo. A baixa escolaridade leva, especialmente os mais pobres, a ocuparem funções mais precárias, em que a taxa de rotatividade é tradicionalmente alta, como atendentes de telemarketing e office boy. Recente pequisa do Dieese mostra que os jovens entre 18 e 24 anos ficavam, em média, 15 meses no trabalho em 2014. Além do baixo salário, que facilita a mobilidade, os trabalhadores que desempenham essas funções são alvo de frequentes cortes, em empresas que demitem funcionários para substituí-los por mão de obra mais barata.

— Os jovens de 18 a 24 anos compõem a parcela da população que acabou de ingressar ou está ingressando no mercado. Por isso, a baixa permanência no emprego é preocupante — afirma Fausto Augusto Junior, coordenador de Educação e pesquisador na área da juventude do Dieese.

Formado em Relações Internacionais pela PUC-SP, Lucas Stanzani, de 24 anos, pretende ser uma exceção às estatísticas e ficar mais tempo no emprego. Afinal, foram sete meses de procura até encontrar seu primeiro emprego em uma empresa de jogos presenciais interativos, os chamados “escapes”:

— Eu me inscrevi nuns 15 programas de trainee, mas as vagas sumiram. Estou aprendendo a dinâmica do trabalho — disse, acrescentando que pensa em buscar uma nova profissão.

 

Aparência e local de moradia são entraves extras

Com o dinheiro que juntou de seu primeiro emprego, em abril, Bárbara Pinheiro, de 18 anos, correu para um shopping da Zona Norte do Rio para realizar um sonho. Saiu de lá com um sorriso no rosto e uma tatuagem no braço: um guarda-chuva, símbolo da série que mais gosta na TV. Já são cinco espalhadas pelo corpo, incluindo frases de música, como “Don’t look back in anger”, da banda britânica Oasis, sua preferida. Por via das dúvidas, nas entrevistas de emprego que fez nos meses seguintes — ela foi demitida do hotel em que trabalhava em junho —, a jovem passou a usar roupas que cobriam as tatuagens.

— Em ambiente de trabalho, procuro ser mais discreta. Sei que tem gente que não gosta — diz Bárbara, que também tirava o piercing quando participava de processos seletivos.

 

VISUAL FORA DO PADRÃO PODE NÃO SER BEM-VINDO

Recrutadores de empresas não negam que a imagem é um fator que pode ser determinante numa seleção. Especialistas em RH afirmam que, na era do Facebook e do Instagram, dificilmente alguém deixará de notar que o jovem tem uma tatuagem ou piercing no nariz. Recomendam, porém, que, se isso não for bem visto no ambiente de trabalho, o melhor é não se expor. Em ambientes mais conservadores, como bancos, o visual fora do padrão não costuma ser bem-vindo. Mas pode ser encarado com naturalidade em ambientes mais informais, como agências de publicidade e produtoras.

— Você não pode nem deve abrir mão da sua individualidade. Mas deve ter em mente que os funcionários são a imagem da empresa. Nesse ponto, a sua imagem se confunde com a imagem da companhia. No ambiente de trabalho, isso precisa ser respeitado — afirma Fernando Mantovani, diretor de Operações da empresa de recrutamento Robert Half.

 

Distância entre casa e trabalho

A distância entre casa e trabalho é outro fator que influencia a contratação. Segundo Mantovani, isso não costuma aparecer de forma explícita nas entrevistas, mas é levado em consideração. A preocupação é por quanto tempo o profissional vai suportar o vaivém diário. Morar longe significa que ele terá mais estresse ou menos horas de sono, o que pode afetar sua produtividade. Levantamento do Dieese mostra que 47% dos jovens de 18 a 24 anos que moram em regiões metropolitanas levam entre 30 minutos e duas horas para fazer o trajeto entre suas residências e o local onde trabalham.

Daniela Fonseca, gerente de Operações do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) admite que a distância entre casa e trabalho é um componente analisado nas seleções para vagas do programa Jovem Aprendiz:

— Essa distância é considerada, pois o jovem precisa de tempo hábil para sair da escola, ir para o trabalho e ainda estudar. A ideia não é que o trabalho atrapalhe o estudo. Por isso, a vaga não comporta grandes deslocamentos.

Morador de Itaipu, em Niterói, Gabriel Durans, de 19 anos, concorreu a duas vagas de jovem aprendiz em empresas sediadas no Rio este ano. Não foi chamado para nenhuma delas.

— Não sei se foi por isso que não consegui, mas certamente a companhia vai preferir alguém que more perto, para economizar com transporte — lamenta.

 

R$ 60 POR SEMANA COM VAN E METRÔ

Desde maio, Tamela Cirsa, de 18 anos, gasta quase quatro horas por dia para ir e voltar de uma das unidades do Senac-SP, na região central de São Paulo, onde é bolsista de um curso técnico em hotelaria e hospedagem. Ela percorre, em uma van e no metrô, mais de 30 quilômetros para chegar ao local das aulas. E sabe que esse esforço não será temporário.

— Esse é o trajeto diário mais longo que já fiz, mas sei que quando arrumar emprego não vai ser perto de casa. Onde moro não tem hotel ou algo do gênero.

A jovem mora numa das regiões mais populosas da capital paulista, mas com poucas oportunidades de emprego. A distância é um peso não só pelo tempo de deslocamento, mas também pelo custo. Por ser de família de baixa renda, ela é beneficiária do passe livre no transporte público, mas o benefício não contempla o período tradicional de férias, como dezembro e janeiro. Como a pausa nas aulas do curso técnico será mais curta, ela já se preocupa com os quase R$ 60 semanais que terá que gastar com a van e o metrô.

— Se não conseguir conciliar as aulas com uma oportunidade de trabalho, vou ter que desistir — conta Tamela, lembrando que estuda à tarde, o que torna mais difícil conciliar emprego em horário tradicional com os estudos.

 

Família: Equilíbrio entre proteção e autonomia

Elas têm a mesma idade, moram em bairros do subúrbio e estudaram em escola pública. Mas iniciaram a maratona do primeiro emprego de pontos de partida distintos. Cristiellen Pereira é filha do militar reformado José Ricardo, e da dona de casa Edileusa. Sua mãe sempre a manteve debaixo da asa. Costumava acompanhá-la até a porta da escola do primeiro ao último dia do ano letivo.

O ambiente em que Cristiellen cresceu — até o início do ano, a família morava numa área de Deodoro próxima a favelas — foi usado como justificativa para o excesso de preocupação da mãe. O pai, fragilizado pelas sessões de hemodiálise e pela perda parcial da visão devido ao diabetes, também queria a filha por perto. Em seis meses, Cristiellen só participou de uma entrevista de emprego. E não passou.

No mesmo período, Bárbara Pinheiro conseguiu a proeza de ter três empregos. Foi demitida de um, pediu demissão de outro e, desde setembro, trabalha na Fundação Getulio Vargas como jovem aprendiz. Aos 18 anos, Bárbara mal conheceu o pai. Mora com a mãe, Ana Paula, e com a avó, Irecê, numa pequena casa em Irajá. Nascida em uma família de matriarcas, viu a avó criar seis filhos sozinha e, desde cedo, foi estimulada a caminhar com os próprios pés.

Segundo especialistas, o ambiente familiar é um elemento crucial para que o jovem desenvolva habilidades, como proatividade e persistência, que fazem toda a diferença no momento de se disputar uma vaga.

— Crescer isolado e protegido promove inseguranças, medos e desconhecimento, prejudicando o psiquismo e, consequentemente, o futuro e as decisões — diz a psicóloga Cristina Silva, do espaço Crescer Psicologia.

 

RITO DE PASSAGEM

A onipresença da mãe de Cristiellen acabou sendo, em parte, substituída pela figura do namorado, Willamy Rocha, de 24 anos. É ele quem a ajuda a procurar vagas em sites. Na sua primeira e única entrevista de emprego, em maio, lá estava ele na van que a jovem pegou para chegar à empresa:

— Minha maior dificuldade nessa busca de emprego era ter que andar de ônibus sozinha. Minha mãe sempre esteve do meu lado, me levava para a escola. Na minha primeira entrevista, fui com o olho deste tamanho — diz Cristiellen.

Edileusa reconhece que a preocupação excessiva pode prejudicar a filha. Aos poucos, está aprendendo a estimular sua independência. Cristiellen não conseguiu trabalho, mas matriculou-se em uma autoescola em setembro, uma vitória para quem, aos 18 anos, só sabia pegar uma linha de ônibus até Madureira, onde costuma passear.

Segundo a psicóloga Monica Portella, associada do Instituto Internacional de Psicologia Positiva, não querer crescer é uma característica da juventude que atravessa gerações. Por isso, diz, os pais devem encorajar os filhos a enfrentar adversidades:

— Isso faz parte do rito de passagem para a vida adulta.

Bárbara enfrentou obstáculos desde o nascimento. O pai abandonou a mãe quando estava grávida. Na busca por uma vaga, conseguiu o emprego de seus sonhos: trabalhar em um hotel na Zona Sul. Mas sofreu um baque menos de três meses após assinar o contrato.

— Um dia fui demitida. Fiquei muito mal, chorei muito. Dava tudo por aquele emprego. Achei que não ia conseguir outro. Mas não queria voltar para a dependência financeira da minha mãe. Fiquei buscando oportunidades em sites de madrugada. Até que fui chamada para uma seleção na FGV. Eram 40 candidatos e duas vagas. E eu passei — orgulha-se.

 

Profissões ligadas a tecnologia e saúde em alta

Um mundo ainda mais conectado, sustentável e com uma população maior de idosos. Essas três demandas futuras são apontadas por especialistas em gestão de carreira como um bom termômetro para se identificar profissões com maiores chances de empregabilidade lá na frente. Mas na escolha da profissão também devem pesar as aptidões e os sonhos pessoais, ressaltam os analistas. Algumas das atividades que estarão em alta, aponta Carla Carvalho, assessora de Carreira da Catho, site brasileiro de classificados de empregos, são médico geriatra, gestor de resíduos, biotecnólogo e especialista em armazenamento de dados em nuvens.

— A gente sempre orienta a busca de um equilíbrio. O ideal é pensar a longo prazo e caçar algo que goste, porque, do contrário, o rendimento pode cair com o passar dos anos, e que traga mais segurança quanto a oferta de vagas e bons salários — aconselha Carla.

Fabricio Vieira, diretor de Operações da recrutadora Korn Ferry Futurestep, diz que é importante os jovens encontrarem a razão de suas escolhas:

— Quando você ama o que você faz, isso influencia positivamente o quanto você será bem sucedido, pois trabalhará com prazer. Isso melhora a produtividade.

 

OPORTUNIDADES COM INVESTIMENTOS EM EDUCAÇÃO

A curto prazo, num cenário em que o Brasil precisará aumentar a produtividade para sua economia voltar a crescer, Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos no Rio de Janeiro, acredita que ocupações ligadas a automação industrial, logística e engenharias serão mais demandadas. Viviane Prado, gerente da Page Personnel, um dos braços da consultoria de recrutamento PageGroup, lembra que a área de tecnologia da informação foi uma das poucas em que as oportunidades de trabalho não minguaram durante a crise. Para ela, o setor continuará promissor nos próximos anos.

— A tecnologia é um caminho sem volta. Todas as empresas têm departamento de TI. Por isso, profissionais que optarem por essa área têm mais chances — diz Viviane.

Com os recentes investimentos de grupos estrangeiros, os setores de saúde e educação também devem se manter como promissores. Embora no setor público professores e médicos estejam enfrentando dificuldades, como atraso de salário e falta de estrutura em escolas e hospitais, na rede privada ambas as áreas estão contratando.

— O investimento estrangeiro no segmento educacional tende a fortalecê-lo, elevando a demanda por professores. No setor de saúde, há desde laboratórios a empresas de seguro de saúde que estão recrutando gente — diz Viviane.

Além disso, ressalta, a expectativa de vida do brasileiro vem aumentando, o que deve elevar a busca por profissionais de saúde com diferentes níveis de escolaridade, de fisioterapeutas e médicos geriatras a acompanhantes de idosos.

 

Salários até R$ 8 mil: 5 áreas que prometem estar em alta em 2017

Uma esperança para Cristiellen Pereira, de 18 anos. Ela concluiu o ensino médio no fim do ano passado, mas as tentativas para conseguir uma vaga foram em vão. Após seis meses de angústia, decidiu voltar para os bancos escolares. No fim de agosto, matriculou-se em um curso técnico de enfermagem, profissão que admira desde menina. As aulas são aos sábado e têm exigido empenho não apenas da estudante como também de seus pais. O curso consome quase 10% do orçamento familiar de R$ 3 mil. Será assim por um ano e meio.

— Ficar tanto tempo em casa dá um certo desânimo. A gente fica procurando, procurando e nunca tem oportunidade. Achei que valia mais a pena voltar a estudar, mas não parei de procurar não — diz Cristiellen.

Continuar estudando também foi uma opção para Gabriel Durans, de 19 anos, que desde maio trabalha como porteiro. Com ensino médio completo, ele aproveita os sábados livres para se dedicar às aulas de mecânica de aviação em um curso especializado.

Qualquer tempo livre, seja no trabalho ou no trajeto de casa, em Itaipu (Niterói), para o curso, em Bonsucesso, no Rio, é dedicado à leitura de como funcionam motores de helicópteros ou turbinas de aviões. O próximo passo será fazer uma prova da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), para obter a habilitação de mecânico de aviação.

— Não vejo a hora de fazer a prova — diz Gabriel, que também dá aulas de bateria nas horas vagas.

Para quem está cursando o ensino fundamental ou os últimos anos do colégio, outra solução possível é o programa Jovem Aprendiz. Por lei, todas as empresas de médio e grande portes têm de contratar um número de aprendizes equivalente a um mínimo de 5% e um máximo de 15% do seu quadro de pessoal, cujas funções demandem formação profissional. São contratos de 11 ou 17 meses, com quatro a seis horas de trabalho diárias quatro vezes por semana e um dia de curso.