O mercado superestimou o crescimento da economia brasileira com o impeachment da ex-presidente e a chegada do novo governo. As apostam falavam em crescimento da ordem de 1,36% em 2017. Mas, pesquisa realizada pelo Banco Central com economistas mostra que o Brasil não crescerá nem 1% o ano que vem. O otimismo foi maior do que a capacidade do governo de recolocar rapidamente o país na trilha da recuperação econômica. O país precisa avançar mais e fazer as reformas necessárias ao desenvolvimento. O foco não é mais apenas a proposta de emenda constitucional (PEC 55), precisamos ir muito além.

"Temos uma lição de casa para fazer. O país precisa dar credibilidade ao mercado, baixando a taxa de juros para incentivar o consumo e atrair os investimentos. Além disso, é preciso fazer as reformas necessárias com a participação da sociedade e das centrais sindicais. É uma missão árdua que requer a participação de todos, mas que se bem feita colherá bons frutos", diz Canindé Pegado, presidente do SINCAB.

A esperada recuperação da economia depois do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff não chegou, e os efeitos da crise atual serão sentidos pelos brasileiros em 2017. Os economistas apostam que o Brasil não crescerá 1% no ano que vem, segundo a pesquisa semanal Focus do Banco Central (BC), divulgada ontem. No auge da euforia com a mudança do governo, em junho deste ano, as apostas eram de 1,36% de expansão. O otimismo foi maior do que a capacidade do governo de Michel Temer de recolocar rapidamente o país na trilha da recuperação econômica.

A melhora depende de reformas, afirmam analistas. O foco não é mais apenas a proposta de emenda constitucional (PEC) que cria um teto para os gastos e que será votada em primeiro turno no Senado hoje. Está na mira o andamento das mudanças na Previdência. Há uma preocupação de que a atual crise política dificulte a aprovação da reforma no Congresso. Os analistas também se preocupam com os efeitos na popularidade do presidente Temer após o episódio da tentativa do Congresso de aprovar a anistia para o caixa dois em eleições passadas.

— Os riscos são fundamentalmente internos nessa nova rodada de crise política — disse o ex-diretor do Banco Central, Alexandre Schwartsman, para quem o otimismo dos colegas na época do impeachment foi exagerado.

A avaliação, hoje, é que a influência negativa de 2016 sobre o próximo ano, o chamado carregamento (carry over), será pior que o esperado. A projeção para o crescimento em 2017 caiu de 1% para 0,98%, segundo a pesquisa do BC. Para 2016, a expectativa passou de uma recessão de 3,4% para 3,49%.

Já os investimentos, o principal vetor de crescimento esperado a partir de janeiro, voltarão em ritmo bem menor que o esperado, já que os juros também tendem a cair mais lentamente. Na rabeira, aparece o consumo, que ainda vai demorar para reagir em um ambiente de endividamento elevado das famílias e desemprego em ascensão.

Está certo para os economistas que a retomada da economia brasileira não será em “V”, ou seja, uma queda seguida de alta. A figura esperada para o futuro próximo é um “L”: uma estabilização da atividade com um tempo mais longo no patamar inferior. A demora ou não dependerá da volta do investimento. E para o empresário voltar a apostar no país, é preciso clarear algumas incertezas.

 

COPOM SE REÚNE HOJE

Ainda no radar de economistas e empresários está a possibilidade de o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, adotar uma política mais protecionista. Essa incerteza pode não só aumentar o dólar e trazer inflação como adiar vários negócios, como a oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) e os aguardados leilões de infraestrutura. Um possível atraso nesses leilões afetaria ainda mais o caixa do governo, que conta com esse dinheiro para melhorar a saúde das contas públicas.

— Se há menos arrecadação que o previsto, claramente vai ter problema fiscal. (O governo) pode ter de aumentar impostos e retardar a queda dos juros — disse o economista-chefe da corretora INVX Global, Eduardo Velho.

É nesse clima que o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) se reunirá hoje. Amanhã, os diretores decidirão se mantêm o ritmo de corte de juros de 0,25 ponto percentual da taxa básica (Selic), que está em 14% ao ano.

As perspectivas para o desempenho trimestral do Brasil também desabam com o fim do otimismo. Há um mês, os analistas apostavam que, no primeiro trimestre do ano que vem, a economia interromperia a queda, ficaria estável e voltaria a crescer no segundo trimestre. Atualmente, a expectativa é de uma queda de 0,52% nos três primeiros meses, com um crescimento bem mais lento em seguida.

A equipe econômica já reconheceu que o desempenho da economia ficará abaixo do esperado em 2017. Tanto que a estimativa oficial para o PIB do ano que vem foi reduzida de 1,6% para 1% na semana passada. Esse é o mesmo percentual que havia sido previsto pela equipe da ex-presidente Dilma Rousseff no início do ano.

Interlocutores da área econômica admitem que a demora do BC em reduzir as taxas de juros também contribuiu para a piora do cenário.

É consenso entre os economistas que, para tentar remediar a situação, o governo tem apenas uma arma que pode ser usada: a taxa de juros. No entanto, no BC, o discurso é que nada pode ser feito artificialmente, para não comprometer o controle inflacionário. Em 2012, a antiga diretoria levou a Selic para seu piso histórico, 7,25% ao ano, e a inflação explodiu, acelerada pela recomposição de tarifas bancárias, cuja alta foi represada pelo governo.

 

HERANÇA RUIM PARA O PRÓXIMO ANO

Para Gustavo Loyola, sócio da consultoria Tendências e ex-presidente do Banco Central, o PIB ainda deve apresentar uma queda de 0,6% no terceiro trimestre ante o segundo e, no quarto trimestre, crescer apenas 0,2%. Mesmo os economistas que estavam mais otimistas com o crescimento do PIB no ano que vem já admitem revisões para baixo. O Santander espera um crescimento de 2% para 2017, mas está esperando apenas a divulgação dos dados do terceiro trimestre para fazer as revisões.

— Estamos adiando o fim do ciclo recessivo. O crescimento esperado para o quarto trimestre talvez fique para o primeiro trimestre do ano que vem. Um recuo do PIB no quarto trimestre fará com que a taxa de carregamento, em vez de nula, seja negativa em 0,6 a 0,8 ponto percentual para 2017. Já vamos começar o ano com uma herança ruim — explicou Rodolfo Margato, economista do banco.

Para Thaís Marzola Zara, economista da Rosemberg Associados, essa demora na retomada é consequência de dois anos de economia fraca, com mercado de trabalho apontando para desemprego ainda em alta e grande capacidade ociosa das empresas, ou seja, não há motivo para consumo ou investimento. Patricia Krause, economista chefe da Coface para América Latina, lembra que, além da queda dos juros mais lenta, a perspectiva fiscal ainda é ruim.

— Esperamos uma melhora com a PEC dos gastos, mas ainda há uma instabilidade política que acaba frustrando as expectativas — avaliou.

 

Go to top
JSN Boot template designed by JoomlaShine.com