No fundo essa reforma só servirá para encobrir a incompetência de um governo falido e já sepultado desde o seu início, com pretensões de se perpetuar no poder e continuar com a bandalheira - de empresários e políticos - que se instalou no país. Antes de se exigir mais anos de contribuição dos trabalhadores, o governo deveria rever as políticas de desoneração e de renúncias previdenciárias; impedir a desvinculação das receitas destinadas aos programas sociais e à Previdência e cobrar seus devedores.

"O que estamos assistindo é um governo sem legitimidade e sem coragem de cobrar os grandes devedores, com o único objetivo de repassar ao cidadão comum a conta para pagar e, ao mesmo tempo, retirar seu direito a aposentadoria. Existem no país mais de 500 empresas que devem um total de R$ 426 bilhões ao INSS, quase três vezes mais que o total do déficit da Previdência em 2016, que foi de R$ 149,7 bilhões. Temos até o relator da reforma da Previdência, deputado Arthur Maia, que é sócio de uma distribuidora de combustíveis na Bahia e deve mais de 150 mil reais ao INSS. Então por que o governo não cobra essas dívidas das empresas? Prefere massacrar o trabalhador? cuidado senhores deputados! 2018 está chegando e cada um será cobrado em sua base eleitoral", adverte Canindé Pegado, presidente do SINCAB.

Apenas cinco dias após os atos espalhados pelo País contra a Reforma Trabalhista e da Reforma da Previdência da última sexta-feira (28) – denominados como Greve Geral, a quarta-feira (3) foi marcada pela votação e aprovação da Reforma da Previdência, na comissão especial, cujo relator é o deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA).

A polêmica Reforma da Previdência passará aos cuidados do plenário. Na Câmara dos Deputados, onde quem preside a casa é Rodrigo Maia (DEM-RJ), o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) precisará de pelo menos 308 votos, em dois turnos.

De acordo com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, uma Reforma da Previdência é mais do que necessária. Na projeção da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2018 foi constatado, que caso uma intervenção neste momento não ocorra, no ano de 2060 o déficit no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) chegue a R$ 10 trilhões, o que, segundo os cálculos, corresponde a 11,29% do Produto Interno Bruto (PIB) projetado para o ano.

Ainda em fevereiro deste ano, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional divulgou um levantamento onde foi constatado que os devedores da Previdência Social têm uma dívida de R$ 426,07 bilhões, o valor devido pelas empresas equivale a três vezes o valor do déficit da categoria, a qual fechou o ano de 2016 em R$ 149, 7 bilhões. Mas por que é tão difícil cobrar esses devedores?

Para o professor de direito previdenciário no Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social, Doutor e Livre-Docente pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Marcus Orione, o que existe é uma real falta de interesse político em tratar seriamente um assunto que, por si só, resolveria o problema da Previdência.

Além disso, o especialista ressalta que empresas isentas de pagar contribuições em cima do valor bruto salarial de seu empregado também contribuem para o rombo. Outro fator problemático apontado por Orione é a Desvinculação das Receitas da União (DRU), que atualmente representa 30% dos recursos da seguridade social.

“É incompreensível, por exemplo, que alguém que seja devedor da prestação de um imóvel financiado para instituições financeiras possa ter o seu imóvel leiloado por ato próprio da instituição financeira credora, e esta mesma instituição financeira possa ficar anos e anos discutindo o seu débito previdenciário e, após, ainda ter o direito de refinanciá-lo a perder de vista. Muitas mudanças poderiam ser realizadas neste campo. No entanto, há pouca vontade política em relação a esta questão, permitindo-se que os devedores da previdência social continuem inadimplentes e sem a severa cobrança imediata de seus débitos”, afirma.

 

Necessário

A respeito da necessidade alegada pelo ministro da Fazenda, Orione destaca que, em certa oportunidade, Meirelles fez uma comparação entre o quadro do Rio de Janeiro com o restante do País, ao afirmar que o estado carioca está em uma crise robusta por conta de sua situação previdenciária.

“Se partirmos desta afirmação, poderemos detectar vários equívocos. Por exemplo, um antigo governador encontra-se hoje preso, acusado de vários desfalques aos cofres públicos. Pense nisto de uma forma mais generalizada envolvendo grandes eventos como as Olimpíadas. Pense na constatação de que o Tribunal de Contas concluiu que as isenções feitas às empresas no Rio de Janeiro daria a possibilidade de pagamento dos salários dos servidores, hoje em atraso, por cinco anos. Pense nestas coisas e pense no Brasil como um todo, pense na corrupção no Brasil. Devolvo a pergunta: será a previdência social a grande vilã ou serão outros os fatores?”, provoca.

Outro questionamento levantado por Orine é se as contribuições pagas estão de fato sendo direcionadas à previdência, saúde e assistência social – fins reais – ou se a receita tem como destino o pagamento dos mais de 40% da dívida pública com os juros da dívida pública, ou seja, para as instituições – muitas das quais elencadas como grandes devedoras da previdência social no Brasil.

 

Proposta

A última proposta do relator Arthur Oliveira Maia, se difere do texto original na idade mínima de aposentadoria. Se antes – tanto para homens quanto para mulheres – a idade mínima exigida era de 65 anos, na mais recente redação, para mulher baixou para 62 anos, além de 25 anos de contribuição.

De acordo com especulações, uma modificação será feita pelo relator ainda nos últimos instantes da conclusão nesta quarta-feira (3). Nesta alteração os policiais legislativos federais – responsáveis pela segurança do Poder Legislativo de Brasília (Câmara e Senado) e pela escolta dos presidentes das mesmas – que hoje somam aproximadamente 500 profissionais seriam incluídos na mesma regra dos policias federais, ou seja, com o direito de se aposentar a partir dos 55 anos.

Anteriormente, os policiais legislativos estavam inseridos nas mesmas normas dos servidores públicos, com exigência de idade mínima de 65 e 62 anos, para respectivamente homens e mulheres somados 25 anos de contribuição para o INSS.

 

Projeções

Embora a filiação ao INSS seja obrigatória, ou seja, basta que o contribuinte realize um trabalho remunerado para contribuir, é inegável que existe uma tendência de busca por alternativas para ingresso no sistema, que na visão de Orione são duvidosas em muitos aspectos – sob viés legal – para a informalidade.

Com a aprovação da Reforma, existirá uma tendência para buscas de alternativa à margem da Lei com o aumento da informalidade, que também é uma conseqüência da Reforma Trabalhista.

Na avaliação de Marcus Orione, a conjunção da Reforma da Previdência com a Trabalhista tende a levar o Brasil para o rol dos países com menor tutela de condições sociais básicas aos trabalhadores do mundo, uma vez que as medidas resultarão em um aumento da ausência de proteção das relações do trabalho. “Logo, tudo o que está se dando no momento tende à definitiva e irreversível falência da rede previdenciária social no País”, conclui o especialista caso, se no futuro, for mantido o que tem sido efetuado.