Já se passaram 128 anos desde que a escravidão foi abolida no Brasil com a assinatura da Lei Áurea em 13 de maio de 1888, pela princesa Isabel, no entanto, o trabalho compulsório e o tráfico de pessoas permanecem existindo no Brasil atual, constituindo a chamada escravidão moderna, que difere substancialmente da anterior. Empresas submetem trabalhadores a condições análogas à de escravidão, praticando dumping social, situação em que uma empresa se beneficia dos custos baixos do trabalho precário para praticar a concorrência desleal e aumentar substancialmente os lucros.

"É uma situação imoral e absurda, ter que conviver nos dias de hoje com empresas que praticam atrocidades desta natureza. Com certeza esses não são os verdadeiros empresários de nosso país que produzem e geram empregos de qualidade. São aproveitadores sem escrúpulos que denigrem a imagem do empresariado brasileiro. Ainda bem que temos o Ministério Público do Trabalho sempre atento e que não deixa passar em branco essas aberrações. É preciso punir, pois o ser humano precisa ter condições dignas de emprego e salário", conclui Canindé Pegado, presidente do SINCAB.

O governo terá um prazo de até 30 dias para divulgar a chamada “Lista Suja”, que é o cadastro de empregadores que submetem trabalhadores a condições análogas à de escravo. A decisão da Justiça se refere à União e ao próprio ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. A decisão da 11ª Vara do Trabalho de Brasília é liminar, ou seja, cabe recurso, e responde à ação do Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal (MPT-DF).

O Ministério Público do Trabalho apontou que o governo descumpre, há sete meses, portaria que prevê a atualização e a divulgação da lista. Na decisão, o juiz do Trabalho Rubens Curado Silveira afirmou que há “injustificável omissão” do Ministério do Trabalho por não cumprir a portaria. Na decisão, o juiz convocou uma audiência de conciliação para o dia 24 de janeiro. Está prevista multa de R$ 10 mil por dia para o caso de descumprimento da decisão.

Em maio, a ministra Carmen Lucia, do Lucia Supremo Tribunal Federal (STF), revogou a medida cautelar que impedia a publicação oficial, pelo Ministério do Trabalho, do cadastro das empresas. Para o coordenador nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete), procurador do Trabalho Tiago Cavalcanti, o cadastro é uma das medidas mais importantes para o combate ao trabalho escravo no Brasil e precisa ser retomado:

- O cadastro dá ciência à sociedade quem são os empregadores e também às empresas que os contratam. Desde maio, não há razão para não publicação do cadastro. O Brasil se comprometeu em âmbito internacional a promover políticas públicas de combate à escravidão.

A recente decisão da Organização dos Estados Americanos (OEA) - que condenou o Brasil por não prevenir o trabalho escravo e o tráfico de pessoas - é uma mostra que país vem sendo monitorado internacionalmente, segundo Cavalcanti:

- Estamos sendo monitorados e não podemos retroceder no combate à escravidão. A divulgação do cadastro é muito importante para evitar esse retrocesso.

Afirmou que o cadastro representa um importante mecanismo de combate à escravidão contemporânea. “Além da expressa previsão na portaria, a ação tem como fundamentos jurídicos o direito fundamental à informação e os compromissos assumidos pela República Federativa do Brasil em âmbito internacional, que impedem retrocessos nos passos já trilhados no contexto do enfrentamento à escravidão contemporânea”, afirma, no texto.

 

OEA condena Brasil por não prevenir trabalho escravo e tráfico de pessoas

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, uma instituição judicial autônoma da Organização dos Estados Americanos (OEA), responsabilizou internacionalmente o Brasil por não prevenir a prática de trabalho escravo moderno e de tráfico de pessoas. A sentença do caso “Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde Vs. Brasil” foi dada nesta semana em um processo que durou cerca de três anos. O Brasil é o primeiro país condenado pela OEA nessa matéria. A indenização deve somar US$ 4,7 milhões.

O Brasil tem um ano para pagar cada uma das 128 vítimas resgatadas durante fiscalizações do Ministério Público do Trabalho na Fazenda Brasil Verde, no sul do Pará, nos anos de 1997 e 2000. Somente nessa fazenda, mais de 300 trabalhadores foram resgatados, entre 1989 e 2002. Em 1988, houve uma denúncia da prática de trabalho escravo na Fazenda Brasil Verde, no Pará, e o desaparecimento de dois adolescentes que teriam tentado fugir.

Além disso, a própria OEA, a partir das informações prestadas pelas denunciantes, fala em “um contexto no qual dezenas de milhares de trabalhadores foram submetidos ao trabalho escravo”. A maioria das vítimas é do sexo masculino, negra, tem entre 15 e 40 anos e morava em cidades pobres, marcadas pela falta de oportunidades de trabalho. Ninguém foi punido e o caso foi levado à OEA pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) e pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).

A sentença também determina que sejam reabertas as investigações sobre as violações cometidas contra esses trabalhadores, o que abre precedentes para a reabertura de casos já arquivados aqui e nos demais países da América Latina. De acordo com a cientista social Beatriz Affonso, diretora do Cejil para o Programa do Brasil, a decisão é fundamental para o combate desse tipo de crime no país, onde existe um padrão sistemático de não realização de justiça nos casos de trabalho escravo, ainda que existam provas.

— Muitos casos ficaram parados para decisão e acabaram prescrevendo. O sistema de Justiça não atuava com a diligência necessária para que os casos pudessem tramitar na Justiça. Por isso a Corte determinou que a prescrição não pode ser obstáculo para investigação e responsabilização de crime de trabalho escravo, considerado crime gravíssimo — disse Beatriz.

 

PACTO DE ERRADICAÇÃO

No caso da Fazenda Brasil Verde, de criação de gado, ninguém foi responsabilizado criminalmente nem os trabalhadores indenizados por dano moral coletivo ou individual por terem sido submetidos a jornadas exaustivas, condições degradantes, ameaça, servidão por dívidas e cárcere privado.

A Secretaria Especial de Direitos Humanos reconheceu a sentença da Organização dos Estados Americanos (OEA), que condenou o Brasil por violações ao direito de não ser submetido à escravidão e ao tráfico de pessoas, às garantias judiciais e ao direito à proteção judicial, em prejuízo de trabalhadores resgatados numa propriedade rural no Pará.

"A Secretaria reconhece, ainda, a legitimidade da Corte como órgão jurisdicional e legítimo intérprete da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e que exerce um papel de grande relevância na proteção dos direitos humanos na região", diz a secretaria em nota.

De acordo com a pasta, a sentença da Corte de Direitos Humanos representa uma oportunidade para reforçar e aprimorar a política nacional de enfrentamento ao trabalho escravo tanto em relação ao conceito quanto à investigação, ao processamento e à punição dos responsáveis pelo delito.

"Neste sentido, recordamos que em 13 de dezembro último foi lançado o Pacto Federativo para a Erradicação do Trabalho Escravo, com a adesão de 14 unidades federativas: Alagoas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia e Tocantins", frisou a secretaria, que completou:

"A sentença poderá catalisar esforços para a manutenção do conceito contido na normativa nacional e o aprimoramento da política de prevenção e erradicação do trabalho escravo".

 

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