Um questionamento de acionistas minoritários da Net levado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) acabou jogando luz sobre uma brecha regulatória que pode permitir que empresas dos níveis diferenciados de governança corporativa da BM&FBovespa sejam, na prática, deslistadas sem que haja uma discussão de preços com seus acionistas minoritários - no jargão financeiro, o fechamento branco de capital.

Em novembro, a superintendência de empresas da autarquia autorizou a Net a unificar ofertas públicas de aquisição de ações (OPAs) por alienação de controle e saída do Nível 2 de governança. No caso de ambas, a empresa não está obrigada a discutir revisão de preços com os minoritários. Meses antes, a Net havia desistido de uma terceira OPA, de fechamento de capital, após acionistas minoritários solicitarem um novo laudo para avaliar o preço da operação. A Net não queria elevar o valor ofertado.

No entanto, conforme questionou um grupo de minoritários, formado pelas gestoras Mainstay, Nest e UV, a Net, por conta de ofertas realizadas nos últimos anos, já retirou de circulação do mercado mais de um terço de suas ações. Em um caso como esse, novas aquisições de ações em ofertas públicas voluntárias, como é o caso da OPA lançada para saída do Nível 2, só podem ser concluídas seguindo os procedimentos de uma OPA por aumento de participação, que dá direito ao minoritário de solicitar um novo laudo. Essa medida existe exatamente para proteger os acionistas do chamado fechamento branco de capital.

Ao liberar a unificação, a autarquia acabou considerando uma oferta voluntária, como a de retirada de nível que é regulada pela BM&FBovespa, como uma oferta obrigatória, caso da de alienação de controle, interpretam os minoritários. Nesse caso, portanto, unificar os procedimentos significaria prejuízo aos pequenos acionistas, que estão impedidos de negociar preços e, também, deixam de ser sócios de uma empresa que mantém compromissos de governança. A Instrução 361 da CVM permite a unificação de OPAs desde que "não haja prejuízo para os destinatários da oferta".

Sem essa espécie de proteção e já com uma liquidez reduzida em bolsa, os atuais acionistas ficariam, de certa forma, pressionados a entregar suas ações.

O caso foi levado ao colegiado da CVM, que, em janeiro, deu início à discussão sobre o assunto. O diretor Otavio Yazbek, no entanto, solicitou vista do processo.

Mauro Cunha, presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), ressalta que a regulamentação não pode ter brechas que prejudiquem os acionistas. "Mas, se isso acontecer, cabe à CVM adotar um viés pró investidor. Ela tem a obrigação legal de zelar pelo investidor", diz. Sem avaliar o caso especifico, Cunha destaca que o episódio mostra a importância de modernização das regras do Novo Mercado. "O segmento foi criado a partir de uma realidade de dez anos atrás. Muita coisa mudou."

Ao fixar que a OPA para saída de nível não pede negociação de preço, a regra não prevê uma situação em que a companhia já tinha adquirido ações em circulação na bolsa, por exemplo.

Em 2010, a Embratel lançou uma OPA para a Net e comprou 92,27% das ações que estavam no mercado. Hoje, retirando ações vinculadas, apenas 1,79% do capital total está na bolsa. Após a legislação brasileira tornar possível o controle de empresas de TV a cabo por grupos estrangeiros, a Embratel Participações (Embrapar) lançou nova oferta obrigatória, ano passado, por alienação de controle. CVM e Net não deram entrevista.

Go to top
JSN Boot template designed by JoomlaShine.com